Jornalista Isabel Oliveira: Vocês já assistiram ao filme Ainda Estou Aqui, de Walter Salles? A película é um sucesso em todo o mundo, e a gastronomia não passa despercebida. Ela, sempre ela, funcionando como um elo, sempre costurando afetividade. Venham conferir a visão do crítico de cinema Rafael Carvalho sobre o filme, que conta uma triste passagem da nossa história, e também para afirmar que a afetividade ainda está presente, por trás de um maravilhoso suflê de Eunice Paiva, adaptado para a coluna Histórias & Sabores pelo chef Jota Moraes".
A conquista do Globo de Ouro pela atriz Fernanda Torres e a indicação ao Oscar fizeram com que todas as atenções se voltassem para os temas, de alguma forma, correlatos ao filme, como a Gastronomia.
O soufflê ou suflê de queijo, como se diz no modo abrasileirado, que aparece na película tem merecido destaque entre os amantes da culinária, influenciadores, gastrônomos e um bocado de gente que quer satisfazer a curiosidade em torno da iguaria. A comidinha é citada algumas vezes na tela, despertando vários tipos de emoções, seja para quem viveu a época ou para quem descobriu o que se viveu por meio do filme, inspirado na autobiografia de Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice e Rubens Paiva, ‘Ainda Estou Aqui’, de Walter Salles.
“Um alimento, um prato que não é um alimento qualquer. Eunice fazia um suflê muito bom, que a família reconhecia, e eu acho que nisso tem mais uma questão de vínculo familiar, e não é só uma lembrança, uma memória afetiva, mas quando você cozinha alguma coisa, principalmente naquele contexto, você tinha uma questão de reunião familiar. Quer dizer, ela não fazia um suflê num dia qualquer; ela fazia um suflé num dia que estava reunindo as pessoas”.
A visão é do crítico de cinema Rafael Carvalho, que assistiu ao filme e também leu o livro do autor. “Acho que é uma coisa um pouco perceptível, que é muito comum nas famílias brasileiras, [...] e isso, de certa forma, acho que aglutina um pouco o sentido, a família. Aquele vínculo familiar é quebrado quando acontece toda a situação da prisão e a família se desintegra, e a mãe precisa se reinventar”.
Apesar de parecer apenas um detalhe no longa, a gastronomia entra para ‘costurar’, permear uma história que enche de simbolismo a película. O suflê passeia entre as cenas mais violentas apresentadas, enquanto, em muitos momentos, se desenrola o cenário da afetividade, a aglutinação do encontro familiar — sem o celular a atrapalhar, diga-se — regado ao suflê, entre os risos, as alegrias da reunião, como observa Rafael.
O ato de escolher uma iguaria, preparar e reunir familiares à mesa tem um efeito festivo e um papel social desde que o homem aprendeu a partilhar um acepipe e, juntos, saborear. E, por que não dizer, partilhar memórias e afetividades, pois a comida acaba por se transformar em um agente de afetividade.
“O suflê aparece em vários momentos e mostra a família reunida para degustar a iguaria em um momento de total integração, até um dos últimos momentos em que a família [aparece] completamente modificada, em outro cenário e contexto. Eles aparecem tentando degustar o prato que ficou na memória; porém, no resgate ao legado material e emocional, a receita de sucesso de outrora desaparece em um cenário de perda”, analisa Carvalho.
Rafael compara um comentário detalhado sobre como o suflê aparece na história como agente aglutinador e, ao final, em um cenário completamente diferente do início, quando a família ainda se reúne, resgata o suflê e tenta refazer a iguaria de Eunice Paiva.
“Ao final do filme, quando Eunice já está velha, há outra reunião de família e as filhas tentam fazer o suflê, mas o suflé não fica bom, não incha, murcha. Quando o suflé não dá certo, ele não fica com aquele aspecto; então, quando elas pegam o suflê, falam: 'É, não deu muito certo o suflê, acho que não vai rolar’”.
O suflé é uma invenção parisiense do século XIX, de massa leve, originalmente feito de queijo ou chocolate. "A gente entende que ele nasce com essas duas versões, tanto a doce quanto a salgada, e que vem de lá [França], desse período romântico da gastronomia francesa. Suflê quer dizer ‘assoprado’ ou ‘assoprar’ em francês. A ideia é justamente a sensação de que ele está aerado, cheio de ar e macio”, detalha o chef Jota Moraes.
Moraes explica, que o souflê é um prato que rende bastante, o que o torna uma opção econômica e nutritiva. “Basicamente, ele leva leite, ovo e farinha de trigo ou maisena e queijo! Em tempos de crise, é possível prepará-lo de forma a render muito, permitindo alimentar mais pessoas”.
O suflê de queijo, que hoje assume um caráter histórico e até nostálgico, como toda comidinha, é um sustento. Mas, como toda receita carregada de memórias, também se tornou um elo entre os membros da família Paiva. Não há dúvida de que o autor do filme incorporou esse prato com um propósito simbólico, representando aconchego, memória, conexão e pertencimento, ao nos apresentar o suflê de Dona Eunice Paiva, que gentilmente é apresentado aqui pelo querido chef Jota Moraes. A receita é pam-pum! Vamos conferir!
Receita do Suflê de Quijo-Ingredientes:
- 100g de queijo ralado de sua preferência (usamos muçarela)
- 3 ovos
- 3 colheres de sopa de farinha de trigo
- 2 colheres de sopa de manteiga (em temperatura ambiente)
- 150mL de leite
- Sal a gosto
Modo de Preparo:
- Pré-aqueça o forno a 180ºC por 20 minutos.
- Separe as claras das gemas.
- No liquidificador, bata as gemas, o queijo, o leite, a manteiga, o sal e a farinha de trigo até obter uma mistura homogênea.
- Enquanto isso, bata as claras na batedeira até atingirem o ponto de neve.
- Com uma espátula, incorpore delicadamente a mistura do liquidificador às claras em neve, mexendo suavemente para manter a aeração.
- Unte a forma com manteiga e farinha de trigo.
- Despeje a massa lentamente na forma, sem enchê-la completamente, pois o suflê crescerá.
- Leve ao forno com cuidado e asse por aproximadamente 20 minutos, ou até que fique bem dourado por cima.
- Sirva imediatamente para manter a apresentação alta e aerada.
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